quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Individualidade e o direito de dispor sobre a vida de outros

O bandido do ônibus 174 foi morto pela polícia.

Se esta é a espécie de justiça que desejam, defensores da "tolerância zero" podem dormir o sono dos justos.

Mas parece que os corolários da lei do cão não lhes aprazem da mesma forma.

Então uma outra lei, uma outra responsabilidade para o Estado, a de prender menores e matar pessoas, certamente irá resolver o problema... não.

O que será que torna a vida nos EUA mais segura?

Seria condenar crianças à pena de morte e prender combatentes de 14 anos em Guantánamo ou seriam estas outras características:

- dar álcool a menor é um crime.

- a grande maioria das escolas públicas dos EUA possuem ônibus escolares gratuitos. Não parar o carro quando um ônibus escolar estiver nas proximidades deixando ou buscando crianças pode dar cadeia.

- Dirigir bêbado dá prisão em flagrante. O motorista é obrigado, na maioria dos estados, a fazer o teste do bafômetro ou admite que está embriagado.

- 85% dos americanos adultos fizeram o ensino médio. O percentual na geração que está hoje na escola é ainda maior.

Que tal estabelecer estas regras acima? É dureza respeitar o limite de velocidade por vezes irreal, e é uma afronta à individualidade fazer o teste do bafômetro?

Transporte escolar gratuito parece muito?

Isso é assistencialismo barato do Estado que não vai resolver nada?

As leis americanas quanto a álcool e trânsito são draconianas e paranóicas?

Isso é "passar a mão na cabeça de bandido?"

Então preste atenção nesta estatística:

ACIDENTES DE TRÂNSITO SÃO A MAIOR CAUSA DE MORTE DE CRIANÇAS NO BRASIL

Mais que qualquer doença ou acidente. O segundo lugar também não é uma causa natural, é o assassinato. Uma super-FEBEM parece mais uma receita para matar mais crianças ainda e satisfazer a velha coceira da antiga mão do chicote do pelourinho.

terça-feira, 15 de maio de 2007

Um presidente do povo, respostas.

Uma série de perguntas sobre o "presidente do povo" andou circulando pela internet ultimamente. Aqui estão as minhas respostas.

1.Por que o presidente do povo usa terno Armani?


Ele não usa terno Armani, não ao menos como presidente (é uma outra marca, muito cara, por sinal). Se ele usa terno Armani quando está em São Bernardo do Campo não é problema meu.

2. Por que o presidente do povo pode ter ensino fundamental incompleto e um gari necessita de ensino fundamental completo?

Porque um princípio básico da democracia é que todo cidadão possua os mesmos direitos políticos, mas isto não parece ser um princípio básico das empresas de limpeza urbana.

3. Por que o presidente do povo acumula aposentadoria por invalidez, aposentadoria de dep. federal, pensão vitalícia de "perseguido político", salário de presidente de honra do PT e salário de presidente da república?

Porque a lei permite, tal como permitiu ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acumular aposentadorias. Além disso o salários de perseguido político deve ser uma porcaria, talvez por isso o Lula tenha decidido concorrer à presidência.


4. Por que o presidente do povo é perseguido político, sendo que passou apenas UMA noite no DOPS?

Ele passou um mês preso e perdeu seu emprego por razões puramente políticas. Mas pode ser que ele tenha entrado naquela cabine do programa do Sílvio Santos, no que este perguntou "você quer trocar o seu emprego por um mês na cadeia, o agravamento da saúde e a morte de sua mãe e uma aposentadoria vitalícia" e ele tenha dito "siiim!" (por interferência da atual primeira-dama, Romeu Tuma deixou Lula acompanhar o velório e o enterro da mãe).

5. Por que o presidente do povo comprou um avião da concorrente da Embraer?

Porque a Embraer não faz aviões do tamanho do "Aerolula", mas dizem que aquela propaganda da Embraer com o Zagallo também influiu.

6. Por que o presidente do povo se aposentou por invalidez apenas por ter um dedo a menos e hoje trabalha como presidente do Brasil?

Ele recebe aposentadoria apenas com base na Lei da Anistia de 1979, mas possivelmente não se acostumou com o torno mecânico próprio para pessoas com nove dedos que fizeram para ele.

7. Por que o presidente do povo protege seus amigos comprovadamente corruptos e nunca aconteceu nada com ele?

a) talvez porque os seus amigos não comprovadamente corruptos o protejam.

b) talvez porque ele não proteja os seus amigos corruptos mesmo.

c) talvez porque ele entrou de novo na cabine do Silvio Santos que, desta vez, perguntou "você quer trocar todos os seus amigos corruptos pelos personagens da Santa Ceia, menos o Judas?" e ele tenha bobeado e dito "nãão!".

8. Por que o presidente do povo se vangloria de não ter estudo e ser filho de mãe analfabeta e acha normal ter filhos estudando fora do Brasil?

Porque ele se orgulha de ter chegado onde chegou sob tantas adversidades, isto é lógica básica. Também porque ele sabe que os filhos dele não são assim tão da peste como ele, já que a vida no ABC não prepara um ser humano para os rigores do mundo como a vida de retirante nordestino.


9. Por que o presidente do povo quando do seu mandato de Dep. Federal, não participou da vida parlamentar do Congresso?

Porque ele era da minoria da minoria do congresso, então seria surpreendente que tivesse diversas leis aprovadas. Também porque aquilo lá não era vida (essa eu colei).

10. Por que o partido do presidente do povo tem ligação com a FARC e ninguém comenta isto?

As FARC, todo mundo comenta isto, mas acho que o presidente entrar no horário político com esse papo não iria dar muito voto. "Você quer trocar o perdão de uma dívida milionária da mídia por uma ilação sobre uma remota ligação com as Farc elevada à vigésima potência?".... "siim!".

11. Por que a mulher do presidente do povo não faz absolutamente nada ?

Ela não foi eleita para coisa nenhuma, e não tem obrigação de trabalhar no emprego do marido. Além disso, a mulher do presidente já faz muito de agüentar a peça.

12. Por que o presidente do povo não sofreu "impeachment" como o Collor sofreu?

a) talvez porque ele seja um presidente do povo, e não um presidente da Globo ou do PC Farias.

b) talvez porque ele tenha sido mais hábil em domar a máquina política que queria estraçalhar a sua estrutura de poder para fazer as mesmas coisas.

c) talvez porque, desta vez, quando entrou na cabine do Silvio Santo e este perguntou "quer trocar a presidência da república por um penico e um coador de café" ele tenha dito "nããão"


13. Por que a candidata Heloísa Helena foi expulsa do PT e o José Dirceu (dep.cassado) e Antonio Palocci (indiciado por quebra ilegal de sigilo bancário e outros crimes) não o foram?

Heloísa Helena entrou em confronto direto com o PT, firmou o pé, foi expulsa e fundou outro partido. Dirceu e Palocci são réus, e não condenados. E mais, achar ex-militante comunista hoje é fogo, pra que se livrar dos que já se tem. Não, a Heloísa Helena não é ex-militante, muito pelo contrário.

14. Por que o presidente do povo nunca soube das coisas do partido e do governo dele, MAS SABE DE TUDO SOBRE OS GOVERNOS ANTERIORES ???

a) Porque antes ele tinha tempo de ler o jornal.

b) Porque hoje não é mais conveniente crer no que está no jornal.

c) Porque ele acha que um presidente não pode agir baseando-se em especulações (o que implica que um político oposicionista podia, para ele).


15. Finalmente, a pergunta mais difícil de todas: Por que tantos intelectuais, cientistas, professores universitários, reitores e outros membros da nata do país, continuam apoiando o presidente do povo?

Tá, a reposta para a pergunta mais difícil de todas é 42. Mas eis a resposta para a pergunta acima:

Porque as pessoas são assim mesmo: estranho seria um consenso todo voltado contra o presidente ou em seu favor. O que é importante para a democracia é que este é um presidente do povo. Bom, tem também aquela história de que, se você se acha mais esperto que o presidente da República, você pode se ver no direito de se achar esperto pra caramba.

terça-feira, 3 de abril de 2007

Atropelado pela realidade .... ou "CTC: uma novela. Capítulo I, parte 1"

Estava escrevendo uma mini-novela para publicar no blog, mas faltou-me tempo. Publico isto aqui, incompleto e mal-ajambrado como está, como testemunho do clima de aproveitamento barato da tragédia da Gol que parecia tomar a imprensa e este ou aquele blog.

Este acidente tornou a continuidade do projeto tristemente desnecessária.


CTC é o acrônimo para o Comando do Terceiro Colhão das forças armadas do Brasil. Esta é uma organização militar e civil de "indivíduos que respeitam a liberdade individual, a livre iniciativa e o livre mercado, bem como a boa ordem, as pessoas de bem, a decência, Deus, a família e a propriedade", que não possui vínculo algum com o Estado Maior das Forças Armadas. Diz-se até que nada que se assemelhe com Estado lhes apeteça tanto, dada a profundidade de seu compromisso com o ideário liberal e libertário.

O capítulo I não trata da primeira atuação do grupo ou de sua formação - esta perde-se nos confins da história - mas da primeira aventura do CTC que se tem notícia na história recente, aventura esta fundamental na formação do caráter atual do grupo.

O leitor há de notar que a ação de "CTC..." se passa ligeiramente adiante na história, a se confiar na data de postagens deste blog, no qual pretendo relatar as diversas aventuras do grupo enquanto se desenrolam.

Sem mais delongas, vamos ao capítulo. Os nomes foram alterados para a proteção de eventuais inocentes.

CTC
uma novela

Capítulo I
Tempestade de alumínio

Já eram 10 horas da noite e a fila de embarque parecia imóvel. Daquele grupo de 5 pessoas, os dois mais velhos entreolhavam-se apreensivos, incertos sobre o sucesso da missão a eles confiada, incertos se os outros 3, ao saberem do teor das ordens dadas, iriam dar cabo daquele "fardo acerbo", que assim lhes foi descrito pelo comandante Neves de Alencastro. Fardo, com efeito, acerbo, o próprio Neves de Alencastro repetiu. Acerbo, de fato, tamanho fardo, em uma variação elegante continuou Neves de Alencastro, antes mesmo que os dois tivessem a chance de concordar.

Sem mais palavra, Neves de Alencastro emendou, que vocês saiam e encontrem-se com os outros três "operativos" que tomarão parte desta missão.

- Fardo acerbo. Disse Ronaldo à saída da sala.

- Sim, deveras. Confirmou Duda, enquanto trocavam olhares firmes, os rostos voltados para o chão, encarando-se apenas com os olhos.

Os outros três operativos aguardavam, sem saber, a saída de Ronaldo e Duda da sala do comandante. Haviam sido apenas informados que agentes, o nome dado aos operativos "sênior", lhes iriam auxiliar em sua primeira aventura pelo CTC.

- Muito boa tarde, meninos. Eu sou o agente Duda Armingal e este é o agente Ronaldo Kannemann. Vocês nos irão acompanhar em nossa próxima missão.

- Beleza, caralho, já tava na hora, porra! Pra onde é que a gente vai!? Exaltado perguntou Marquinhos Eleno, um dos "meninos".

- Se o Sr. deseja que seus préstimos sejam um dia apreciados pelo alto comando do CTC, sugiro-lhe que reveja seu vocabulário. Consta no código de conduta do Comando que a comunicação há de dar-se pelo português mais castiço que estiver à mão. Termos de baixo calão reservam-se apenas ao acrônimo de nossa organização e a comunicações em código.

- Minhas mais sinceras desculpas. Por favor compreenda que foi coisa do momento e da qual muito me arrependo. Estarei futuramente prestando mais atenção.

- Operativo, qual o seu nome?

- Hein?

- Operativo: nome, número de inscrição e data de incorporação já!

- Meu nome é Marcos Eleno - deixa eu ver no papel aqui - meu número de inscrição é 108072360-3, e minha data de incorporação é 14 de abril de 2(...).

- Kannemann, por favor.

- Marcos, pode repetir, por favor? Ronaldo se dirigia a Marcos com alguma timidez.

- Marcos Eleno, número CTC 108072360-3, data de incorporação 14 de abril de 2(...).

Ronaldo Kannemann anotou os dados e o que parecia ser um relatório em seu PDA. Falava então com mais desenvoltura, sem olhar para Eleno, mudando de expressão facial e entonação como se discursasse para a tela reflexiva do computador de bolso, sobre a qual escrevia com uma caneta de plástico.

- Entenda que o código de conduta do CTC é a nossa tábua de salvação moral. Ele é propositadamente extenso e detalhista, pois nele estão descritos procedimentos que salvaguardam a garantia de nossos checks and balances no trato com membros, oponentes e civis, além de conter a plataforma pela qual

incompleto, agora sem razão de existir.





sexta-feira, 23 de março de 2007

A praga reincidente da informação retocada.

Ouve-se de um tempo em que as fotos do camarada Lênin eram continuamente retocadas, pois a cada passo em falso de um dos outros camaradas da foto, o governo soviético empreendia uma laboriosa operação de desaparecimento.

Desconheço se o retoque da foto era o primeiro ou o último passo do processo, ou se isto variava de acordo com a situação (vendo a União Soviética jogar futebol tem-se a impressão de que nada por lá variava). Sei, porém, que os registros iam se tornando mais solitários e mais parecidos com as propagandas do regime.

Eu me pergunto se estas idéias vinham diretamente de Tio Stálin ou se seus seguidores as implementavam de bom grado, adivinhando as querências do líder. Me pergunto, também, se Stálin sabia dos retoques, e ainda se alguém apagou o premiê ou um de seus apoiadores alguma vez, fosse na foto ou na metáfora bem conhecida.

Tenho certeza, no entanto, de que Stálin sentia-se confortável com o procedimento.

O papa Bento XVI disse que o segundo casamento era uma 'plaga' em latim, 'piaga' em italiano, 'plaie' em francês, 'Plage'em alemão, 'scourge' em inglês (claro que eu colei do site do Vaticano). No português do Brasil, ele disse uma superposição de 'praga' com 'chaga', a gosto do freguês.

Quando pareceu que o papa havia igualado o segundo casamento a uma nuvem de gafanhotos a assolar a Terra, retoques na retórica não tardaram a surgir. A questão dispendeu horas de redação e gigabytes de transações pela internet.

Chaga inspira pena e praga, recriminação. As duas palavras têm a mesma origem, contudo, parafraseando outro blog, pela figura de linguagem "metáfora ou metonímia".

Com o retoque, a condenação do papa não deixou de ser dura, mas a praga, a recriminação a todos os nubentes de segunda época, tentou-se tirá-la da foto. Cá entre nós, creio que ela continue lá, inteirinha, em todas as suas chagas alastrantes independentemente do termo.

Paulo Maluf dizia 'eu não assinei', 'eu não estava lá', 'não era eu'. Lula dizia 'eu não sabia', 'eu fui traído'.

Bento XVI nada disse, nem mesmo retirou palavras ou desculpou-se como no caso do texto que condenava muçulmanos (texto este em que o principal, a defesa do papel da racionalidade no cristianismo, passou em branco).

Mas Bento XVI sabia?

Ele se sente confortável? Certamente, ainda que ignore a celeuma por completo.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

sábado, 10 de fevereiro de 2007

O Mano White... contrariando as estatísticas (desfeita e piparote II)

...Reinaldo Azedo não sabe nada de rap, compreensível.

Não sabe nada, também, de cultura, de ciências humanas em geral, também compreensível.

Post azedo este aqui. Resposta a isto aqui


Eu sou apenas um rapaz latino-americano
apoiado por mais de cinüenta mil manos
efeito colateral do que o seu sistema fez
Racionais, capítulo 4, versículo 3.


A torrente de opiniões desabridas demonstram uma ignorância profunda não apenas de rap, mas dos filósofos cujos nomes jogou no texto e até do poema de Drummond usado na citação, o que torna, aliás, evidente por que sua crítica é tão calcada em preconceito.

É prática comum dos blogs de self-made-sabichões desqualificar quem lhes vêm à mente um parágrafo de cada vez. É claro que isto faz parte do intento de quebrar espuriamente a unidade do texto que se analisa e é um artefato útil quando se não tem intenção alguma de analisar o que se está analisando, mas apenas escrever frases de efeito, jogar para a platéia. Também é um expediente útil àqueles que não desejam ou são incapazes de dar unidade a seu texto, pra começar.

O resultado deste ataque ao caráter parágrafo a parágrafo é, por sua vez, melhor analisado da mesma forma, sim, parágrafo a parágrafo também. Esta espécie de sucedâneo de refutação termina por resultar em um texto este sim quebrado e sem unidade, e é com este parágrafo que deveria começar qualquer refutação de uma análise parágrafo a parágrafo, adicionando-se a ressalva que a refutação, ainda que seja também ela uma análise desta natureza, empenhará os melhores esforços para extrair continuidade de uma origem e uma técnica destarte defeituosas.

Parágrafo a parágrafo, aqui vai:

A história da música X a história.

Bem, trata-se de do recurso a uma falácia lógica freqüentemente usado pelo autor, abaixo tratada com mais atenção, e de um certo preconceito na interpretação do texto que vou exemplificar fazendo a mesma coisa. Lá pelas tantas, o autor diz "36 anos. Taí uma coisa que nunca tinha imaginado, um rapper coroa". O autor demonstra conhecimento da expectativa de vida dos habitantes da periferia e com ela faz uma brincadeira de péssimo gosto, demonstrando como nutre desejos assassinos com relação a eles e se ri do destino daqueles nas mãos do PCC que tanto o incomoda em outras partes da cidade.

"Salve" do PCC versus o "Salve" do Mano Brown.
Novamente, um preconceito aflorado em uma identificação tão espúria quanto a de Barack Obama e terroristas muçulmanos. Certamente é o mesmo salve, vindo de pessoas que moram na mesma região, vítimas e perpetradores, proximidade versus semelhança, ou um propositado recurso a outra espécie de raciocínio falacioso ou uma demonstração de como o autor é incapaz de diferenciar indivíduos afora seu pronunciado preconceito, e claramente deseja todos mortos ou encarcedados.

"Logo, você conclui que Mano Brown, na escala dos ungidos ou dos profetas, é superior a Cristo."

Aqui a falácia lógica em toda a sua extensão. "Crer no poder redentor do sangue de Cristo" é uma atividade de natureza e implicações muito diversas às de assistir a um DVD. Para resolver a falácia, pode concluir-se deste comentário que o autor está a impelir um julgamento de natureza religiosa contra o rap, uma postura comum, no entanto superada e tida como altamente preconceituosa.

"o coitadinho tentou mudar de vida" etc...
Sim, na base da inferência irresponsável dá para apostar em qualquer coisa, inclusive que o autor está apenas traficando uma posição ideológica e uma propaganda política em uma análise sem pés nem cabeça, como em seu artigo da Bravo sobre Mário Faustino (falecido nos anos 60), datado de 2002, em que consegue citar o PT. É verdade que há público para este tipo de pantomima.


"Pensador do mundo musical"

O autor obviamente jogou nomes de filósofos aqui, fez umas embaixadinhas para a platéia. Um dos três talvez concordasse com o seu texto. Kant, certamente, não, e todos corariam ao ver a falácia lógica básica do parágrafo anterior. Schopenhauer a igualaria, em categoria, não em competência ou extensão, à de Hegel.

Ah, sim, Drummond...

... eis o poema:

Infância

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala – e nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.

Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu... Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro... que fundo!

Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.


Particularmente as duas últimas estrofes, e cá estão elas novamente

E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.


Desaprovam a aversão do autor pelo vocabulário, histórias, talvez pela própria existência dos habitantes da periferia de São Paulo.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Recente intercâmbio com um leitor

Eu detesto ter a última palavra, então espero que este leitor ou outros voltem a comentar aqui.
Os comentários são a respeito de um post chamado "Hayek como papel higiênico, I"
Reginaldo Almeida said...

Caro Jaboticabo,

Por que essa generalização? Por que afirmar que os conservadores que apoiaram o Golpe de 64 são os liberais de hoje?

Cheguei ao seu blog a partir das suas intervenções no Blog do Rodrigo Constantino, algumas boas, outras um tanto extremistas.

Eu diria que quase a totalidade das pessoas que escreveram comentários no post que falava da maioridade aos 16 anos nem era nascida em 1964, como afirmar que esses são os caudatários daquilo?

Ser liberal não é dar as costas aos pobres e sim afirmar (palavras minhas) que um governo como o nosso não só não serve aos pobres, como é o principal responsável pela concentração de renda, além de só servir a umas certas aristocracias políticas (à direita e à esquerda), que vivem do rent-seeking.

Hoje cobra-se impostos de França e temos serviços de Somália. Hoje fala-se em neo-liberalismo, mas países como a França ou a Suécia são mais liberais que o Brasil.

A única ajuda que o governo dá aos pobres é o Bolsa-Família (de eficácia duvidosa). Todo o resto ele não dá a ninguém, exceto à própria máquina.

Não temos educação, mas nós (falo da infeliz classe média)pagamos por ela (duas vezes), não temos saúde, mas também pagamos por ela, não temos segurança, mas também pagamos por ela (às vezes com a própria vida).

Todos os governos no Brasil (digo novamente, tanto à direita como à esquerda) sempre gastaram muito mal os impostos arrecadados. Sempre se encastelaram com os seus apaniguados e foram eles que comeram o nosso dinheiro. Hoje gasta-se mais com publicidade que com segurança ou saneamento ou habitação, isso está correto? Hoje o Governo Federal é o maior anunciante de mídia do Brasil, e se não me engano, em segundo e terceiro estão a Petrobras e o Banco do Brasil, e só em quarto estão empresas como a AMBEV, Coca-Cola, Unilever ou Procter & Gamble. Que produto é esse que o governo vende? Eu sei que eu pago, mas nunca vi o produto.

Segundo a BBC Brasil, nos EUA, uma país mais rico e de maior população que o Brasil, o governo federal dispõe apenas de 5 mil cargos de livre nomeação, enquanto que aqui 30 mil.

Se o governo se retirasse de atividades como a bancária ou a petrolífera e com esse dinheiro investisse em habitação, saneamento, saúde e educação, tenho certeza que estaríamos melhores.

Tenho certeza também que se abolisse o IPVA, o IPI e a CIDE e privatizassem as estradas federais e estaduais, teríamos um aumento percentual da economia pelo aumento na venda de carros e mais dinheiro na mão do consumidor (calculei que o brasileiro gasta em média 3 mil reais com IPVA, CIDE e reparos dos autos) e nunca se gastaria isso em pedágios, com a frequencia com que se viaja hoje.

Liberalismo é isso. É indignar-se por pagar impostos e não ver resultando (nem para o próximo, nem para mim). É indignar-se por ter posses e ser chamado de porco burguês, mesmo que as posses tenham sido conseguidas de forma legal, honesta e legítima. É indignar-se ao ver um monte de vagabundos, que na chegada de um novo governo, agarram-se às suas nomeações como um carrapato a um cachorro. É ver um José Dirceu que nunca faz nada nessa vida exceto vagabundagem político-estudantil viajando de jatinho, se auto-intitulando consultor de empresas, e dizendo que é do povo, que trabalha para o povo, ou ver um Luiz Gushiken (um reles bancário semi-analfabeto) tomando vinho de R$ 2500 a garrafa e fumanfo charutos cubanos. Essas cigarras sociais nunca souberam o que é ser formiga, por isso comem sardinha e arrotam caviar!

Isso é ser liberal!

Reginaldo Almeida

Jabuticabo said...

I doubt that good economic writing can be devoid of humor. This is not because it is the task of the economist to entertain or amuse. Nothing could be more abhorrent to the Calvinist gloom which characterizes all scientific attitudes. But humor is an index of a man’s ability to detach himself from his subject and such detachment is of considerable scientific utility. In considering economic behavior, humor is especially important for, needless to say, much of that behavior is infinitely ridiculous
John Kenneth Galbraith

Caro Reginaldo,

Este blog aqui e os comentários que fiz lá e em outros blogs têm a intenção de colocar uns pontos de interrogação em alguns mantras repetidos à exaustão e creditados ao advento da nova e grande teoria libertadora do liberalismo econômico, atrelada à globalização.

E já pensou como um mantra com um ponto de interrogação pode ser uma ferramenta filosófica muito mais eficaz?

Em vez de repetir-se infindamente, como que em um transe

"todo monopólio é injusto, o monopólio estatal é mais injusto ainda"

se instilasse uma dúvida aristotélica pela repetição de

"todo monopólio é injusto? O monopólio estatal é mais injusto ainda?"

ao menos geraríamos respostas mais satisfatórias à pergunta que hoje nem é feita.

A intenção deste blog é, também, fazer isto com alguma graça.

E tudo isto para explicar o porquê de ser "extremista".

(Repórter)
'What do you think of Western Civilization?'
(Mahatma Gandhi)
'I think it would be a good idea!'


Em uma sociedade que se crê caudatária de Grécia e Roma, é natural que se encontrem aqui e ali saudosos de um golpe que ocorreu há menos de meio século atrás, como também é natural que se encontrem comunistas, peronistas e vascaínos andando pelas nossas ruas.

E existe um teste básico para verificar esta simpatia pela democracia "por partes" (basicamente, só a parte que interessa ao tal simpatizante): em 1964, o Brasil deveria passar pela presidência de João Goulart e derrotá-lo na próxima eleição, se fosse o caso? O golpe e os 21 anos de ditadura não foram muito piores? As respostas estão na imprensa e em livros publicados nos últimos poucos anos e, na opinião deste jabuticaba aqui, não são alentadoras.

Por trás de toda esta recém-descoberta paixão humanista pela individualidade e pela economia neoclássica parece haver toda uma agenda que nada tem de liberal, e eu sempre deveria escrever isto em um parágrafo só para ela:

o bom e velho conservadorismo brasileiro.

Pena de morte, prisão de menores, restrições de direitos diversos entre outras traficâncias da velha intolerância dos tempos de D. João Charuto, e outras novas adequadas às necessidades recentes da gente-bem: menos impostos para os negócios (vai ser curioso acompanhar a reforma tributária, se ela acontecer: como a maior parte dos impostos no Brasil é carregada por quem consome itens básicos, eu me pergunto se um corte de receita de impostos do governo no lado do povo "bolsa-família" satisfaria os negócios apenas por suas conseqüências macroeconômicas ou os deixaria com o muxoxo dos descontentes que não conseguem comprar um Nintendo Wii), instabilidade trabalhista, maior violência policial e prisão para todo mundo.

E este é apenas um dos lados da minha crítica, sempre a ser feita com o melhor bom-humor que eu conseguir ter.

Não nos enganemos a respeito da finesse e da classe dos nossos políticos. Vemos sendo governados por uma certa elite política a aspirar o ar de salões parisienses, para depois entrar em um carro com ar-condicionado no meio do cerrado desde 1960. Antes disso, só mudava que, ao menos, os governantes estavam no Rio.

Libertariamente falando, é salutar que um semi-analfabeto seja capaz de bebericar vinhos finíssimos. Também o é que alguém incapaz de verter um substantivo básico ao plural seja vice-presidente, ou ainda que alguém com imensa dificuldade em escrever duas frases conectadas possa ser presidente: estou falando dos EUA, de Dan Quayle e George W. Bush.

Os que tomavam vinhos caros e charutos cubanos nos nossos palácios antes não me inspiram simpatia maior por terem ido ao MIT e não ao Senai. Já dizia a propaganda de Sprite que imagem não é nada, sede é tudo. Nos EUA, o pré-candidato à Presidência do momento se chama Hussein Obama, e isto é um exemplo de liberdade, da liberdade primeva, daquilo que carregamos entre as nossas orelhas.

Polinização inconseqüente.

Salve Abelha Rainha do neocivilizado Brasil, quem decretou nossa estupenda e repentina civilidade e tradição libertária arraigada em nossos maiores livres-pensantes por séculos... mais um daqueles que conseguem esconjurar o passado, maldizer o futuro mas justificar o presente em todos os seus detalhes... Estou falando do Reinaldo Azevedo... Vale a pena lutar por isso? Não vale a pena lutar pelo Reinaldo Azevedo? Sua pergunta em seu blog era "vale a pena lutar por isso?"

Vale a pena lutar por isso? O que ele tentou expressar talvez fosse "vale a pena lutar contra o aquecimento global?"

Que o digam todos os que ignoraram o alerta dado ainda nos anos 70 sobre o efeito dos halocarbonos na camada de ozônio.

A boa ciência apenas é boa quando temos Marshall justificado por Jevons justificado pelas equações diferenciais estocásticas e os modelos de otimização da boa economia neoclássica?

A "verdade" científica é apenas a que nos interessa? Isto sim é totalitarismo.

Vale a pena lutar contra o totalitarismo? Não, se você está do lado certo do cassetete, ao que parece.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

13

com este, vão se
13 posts neste blog em 13 meses...
... 13% de juros ao ano de alegria pós-fixada e devidamente indexada...
... 13 dias de busca na cratera em São Paulo terminados...
... hoje é dia 26, "duas veis treze" tem treze letras...
a culpa é do PT, então?

Similaridade e conseqüência se confundem propositadamente em autores astutos, e não excluamos os grandes filósofos e cientistas. Na justaposição você enxerga o julgamento destes autores e, por vezes, o de sua própria alma.

A Folha, sobre Lula em Davos:

Vim em 2003 [logo após a posse] mostrar como era possível criar uma política consistente para reduzir a miséria no Brasil", gabou-se.

terça-feira, 16 de janeiro de 2007

Uma cratera

Uma cratera é uma cratera. Uma cratera não é amoral. Uma cratera não vota, não tem partido político. Uma cratera não tem gosto, cor, ou peso. Uma cratera não tem nem profundidade. Uma cratera é, apenas, convexa.

Nesta hora de aperto, nada vale o que eu ou o ninguém mais pensamos, achamos deixamos de achar gostaríamos de querer achar sobre qualquer coisa. Nesta hora uma jabuticaba nesta hora é só uma fruta redonda que vive a cair do pé e suja a roupa. Nesta hora o que sobra é só uma cratera.

terça-feira, 9 de janeiro de 2007

Hayek como papel higiênico, I.

Existe uma diferença entre ser e dizer-se ser. Os articuladores do nosso passado são os mesmos que desejam desarticulá-lo no futuro, e por isso os considero aproveitadores de hoje e de ontem. O liberalismo é apenas a célula-tronco da vez na construção do grande novo sentimento conservador brasileiro.

É necessário dirigir uma pergunta aos seguintes grupos, hoje tão liberais, verdedairos libertários no século XXI:

a) perpetradores e simpatizantes do golpe de 1964 (ao contrário de Stalin, estão bem e vivos) ,

b) criadores do modelo do milagre brasileiro, do ora tão amaldiçoado Estado investidor,

c) apoiadores da censura, da tradição, família e propriedade e bons costumes de gente de bem. Promotores silenciosos obsequiosos ou beligerantes de balcão de botequim dos assassinatos políticos em nome do Estado.

d) outros que tenham propalado a moda do momento antes e depois: antes, golpe "governar é construir estradas" tortura empréstimos internacionais, hoje, democracria civilizada pois tudo que é inglês é bom e sábio e como é que puderam votar nesse cara? Banco Central do Brasil empréstimos internacionais.

A pergunta é "quando isto também der errado, vocês vão apoiar o quê?"

É muito bonito citar Hayek, "why the worst get on top", amaldiçoando altitonante do olimpo da moral absoluta todo esforço contaminado pela "síndrome da vontade política" como um congraçamento com Stálin, Mao e todos os outros artífices do pecado original, da semente do presumível engodo a que todos os que levantam a cabeça e perguntam "tem outro jeito?" estariam fadados ou então maliciosamente embarcaram, na inescapável busca individualista pela máxima utilidade, tal qual um escorpião sobre um elefante atravessando o rio. E isto se for para considerar que a avaliação de Hayek é desprovida de contradições

Mas vejam que usualmente no Brasil nem se chega mesmo a citar Hayek, Adam Smith ou, sei lá, James Naismith com a sinceridade de um campo de abóboras. A coisa pára bem antes disso, antes de que se possa apontar uma falácia na fundamentação do típico raciocínio pseudoliberal do início do século no Brasil. Os próprios Hayek e von Mises corariam ao ver como as coisas funcionam por aqui. Ficariam mais encabulados do que se fossem escalados como extras do filme "Um drinque no inferno" e assistissem à apresentação de Selma Hayek lá pela metade do filme. Reproduzindo o que poderiam dizer os próprios, os liberais daqui não gorgeiam como os de lá.

Mais do que uma desculpa, ser liberal é então uma boa razão para continuar igualzinho? Uma desculpa confortável para achar que as coisas como estão estão boas, a não ser quando a gente não gosta de como elas são?